sábado, 1 de maio de 2010

Mário Rui de Oliveira - A caruma e os pinhões de Roma


No Público de hoje, está um texto com o retrato de quatro padres portugueses que trabalham no Vaticano ou em instituições católicas em Roma. Este é o retrato de Mário Rui Oliveira.

A praça junto do Panteão está apinhada nesta sexta-feira de sol, em Roma. O padre Mário Rui de Oliveira, de 37 anos, que trabalha no supremo tribunal da Igreja Católica, consegue, mesmo assim, ver pormenores escondidos: as cores das casas em volta, uma "edicola", o nicho com uma pintura de Nossa Senhora numa das paredes...

O café tomara-se antes, no Sant"Eustachio, onde se bebe um dos melhores cafés em Roma. Instantes depois, diante da sóbria grandeza do Panteão, símbolo da história da cidade, confessa que "há um Mário antes de Roma e um Mário depois de Roma". Não por acaso: a capital italiana está presente nos dois livros de poesia que publicou: Bairro Judaico e Vento da Noite (ed. Assírio & Alvim).

"Saio de casa para olhar o mundo", escreveu num poema. "Essa descoberta, esse desejo de olhar o mundo, é fruto de Roma. É reencontrarmo-nos com o que se deixa nestas ruas", diz, por entre grupos que tiram fotos, comem ou riem. Ou que apenas conjugam o verbo estar, neste princípio de tarde como só Roma oferece.

O padre Mário Rui vive entre a ordem do Direito Canónico e a desordem da cidade: "Mesmo no meio do caos e da agressão, Roma torna-nos atentos à santidade e à beleza." Por isso é possível ver toda a cidade fazendo percursos através das pequenas fontes ou da pintura de Caravaggio, sugere. "A caruma e os pinhões são um dom de Roma", escreveu, num outro poema.

"Estar na Piazza Navona, com o sol a bater nos edifícios de Borromini dá-nos a sensação de estar só com o que se ama, como se fosse só meu."

Sente vontade de voltar a publicar - talvez ainda este ano. "Com o volume de trabalho, a poesia é também salvação." Mas que trabalho é este? Mário Rui de Oliveira está desde 2007 na Assinatura Apostólica, o supremo tribunal da Igreja onde, por exemplo, aprecia pedidos de nulidade matrimonial.

Um modo de ajudar, diz o canonista. "Para alguém com fé, poder celebrá-la de novo e evitar o sofrimento pode ser importante." Recorda um casal que pediu a nulidade do casamento e teve resposta afirmativa, depois negativa em segunda instância. Teria que ser resolvido em Roma, com longa demora. O casal pediu para o caso ser apreciado em terceira instância em Portugal, para poupar tempo. A resposta foi positiva. "Está em execução e as pessoas estão livres."

Recuperar essas vidas "daria um grande romance". Como ir ao encontro das pessoas e perguntar "que vidas têm agora". Sobra tempo para sonhar esses sonhos ou para "passear, partilhar uma boa "pasta" e um bom vinho, participar na oração da Comunidade de Santo Egídio, rezar as vésperas na Capela Sistina com 50 ou 60 pessoas ou acompanhar um grupo de idosos e doentes que se correspondem com condenados à morte no Texas".

"Talvez as vidas sejam tocadas, mesmo que levemente, pelo sorriso de Deus", escreve em outro poema. "No meio do sofrimento, descobrir que Deus continua a sorrir e entra na vida das pessoas é criar uma alma", diz agora, diante do Panteão.

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