quarta-feira, 17 de julho de 2013

José Dias da Silva (1942-2013): Um porteiro do Reino de Deus


(foto reproduzida daqui)

No último texto do blogue que alimentava, escreveu, em dia da festa de Santo António: “Os pobres são os porteiros do Reino de Deus.” José Dias da Silva manteve até ao fim a fidelidade a profundas convicções de quem aliava a fé em Jesus à confiança num futuro mais justo e solidário para a humanidade. Por isso, pediu que, no seu funeral, não houvesse flores e que, quem quisesse, substituísse esse gesto pela contribuição para o fundo solidário do Instituto Universitário Justiça e Paz, que apoia estudantes do universitários com dificuldades económicas.
O funeral de José Dias da Silva realiza-se esta manhã, da Igreja de São José para o cemitério da Conchada, em Coimbra. Despedimo-nos, assim, de alguém que sabia aliar fé e compromisso, como diz o título do blogue onde escrevia.
Essa síntese foi sempre, aliás, uma das preocupações maiores do Zé Dias, como o tratavam os seus amigos. A sua preocupação era ser coerente com a fé em Jesus, que o animava, e com aquilo que lia da Bíblia e do pensamento social da Igreja, que conhecia como poucos. Apesar de há vários anos lutar contra a doença que o minava, tinha ainda tempo para telefonar e escrever a outros a perguntar pela saúde, a animá-los nas desventuras da vida, para ser solidário, para desejar que a vida fosse mais benévola para todos ou para programar actividades que ajudassem a divulgar a doutrina social da Igreja, para continuar como membro da Comissão Nacional Justiça e Paz, da Comissão Coorde­nadora Nacional das Semanas Sociais e da Comissão Permanente do Conselho Pastoral Diocesano de Coimbra.
Pode dizer-se que essa reflexão sobre as consequências sociais e políticas do evangelho era uma das suas grandes paixões. Era ele o responsável pelo módulo de Doutrina Social da Igreja na Escola de Leigos da diocese de Coimbra, além de ter orientado e participado em dezenas de cursos e encontros. Colaborador do Instituto de Estudos Teológicos, publicou os livros Viver o Evangelho Servindo a Pessoa e a Sociedade – Introdução à Doutrina Social da Igreja (ed. Gráfica de Coimbra) e Memórias de um Tempo Futuro, que reúne crónicas publicadas na revista Além-Mar, dos Missionários Combonianos, e no jornal Correio de Coimbra.

Além dos “Sinais”, que publicou durante largos anos na Além-Mar, e de O Correio de Coimbra, também o Notícias de Vila Real e as revistas Mensageiro de Santo António e Estudos Teológicos eram publicações com que colaborava.
Nascido a 15 de Março de 1942, no Souto de Brejo, Pampilhosa da Serra, José Dias da Silva era casado e tinha dois filhos.
Tendo frequentado durante oito anos os seminários da diocese de Coimbra, acabou por se licenciar em Físico-Químicas pela Universidade de Coimbra, tendo depois chegado a assis­tente do Departamento de Química da mesma universidade. Foi investi­gador em Química de produtos naturais e em Química Teórica. Reformou-se após duas décadas de trabalho, para se dedicar a tempo inteiro às suas responsabilidades familiares e às tarefas eclesiais e sociais nas quais se envolvia.
Em todos os textos e intervenções, mesmo nas conversas pessoais que mantinha, vinha ao de cima a sua profundidade bíblica e teológica, aliada às preocupações sociais. Na Além-Mar, escrevia por exemplo em Junho de 2009, sobre “Cidadania e imigrações” e a propósito da identidade cultural dos imigrantes: “Este reconhecimento (...) implica, pelo menos, duas condições: vencer os nossos preconceitos, imitando a confiança de Abel e não o ressentimento de Caim; manter um diálogo leal entre as várias mundividências, superando, a todo o custo, a confusão de Babel pela abertura do Pentecostes.”
Paz, direitos humanos, cidadania, imigração, tráfico de pessoas, direitos das crianças, o lugar das mulheres na sociedade, a maior consciência eclesial dos crentes, a participação dos leigos na vida da Igreja, o estilo de vida, a pobreza, o desenvolvimento, o comércio justo – todos esses e muitos outros temas faziam parte da vasta agenda de consciencialização de José Dias da Silva.
Não por acaso, o texto citado no início acabou por tornar-se no último de uma série sobre os textos da Bíblia que mais o marcaram: “Quem diria? Os mais esquecidos e abandonados pela sociedade, pelos governantes, os que ninguém conhece, são esses que irão abrir-nos a porta do Céu. No Reino de Deus é assim: como os que mais precisam são os que menos têm, são estes que têm a prioridade.”
E a concluir esse artigo, escrevia, sobre a parábola do juízo final, no evangelho de São Mateus: “Também eu me senti empurrado por estas palavras a ajudar os outros, de acordo com os meus talentos e as minhas limitações. Na fase em que me aprestava para iniciar a minha vida profissional, estas reflexões foram muito importantes para orientar o meu futuro.”

José Dias é um bom porteiro do Reino de Deus.

2 comentários:

Moçambicano disse...

Recomendo a leitura da sua Crónica "É muito bom estar vivo".
Um grande Testemunho de Fé, e de Amor pela Vida, de um Grande Cristão.

Moçambicano disse...

"Cá vamos vivendo embrulhados no Amor e na Fé, na Esperança de uma Felicidade Eterna".
Obrigado por essa Esperança, Amigo.