terça-feira, 27 de outubro de 2015

Sínodo: "A imagem viva duma Igreja que não usa formulários preparados por antecipação"

   
 
     No final dos trabalhos sinodais, o Papa Francisco fez uma alocução que constitui uma leitura relevante daquilo que lá ocorreu.
     Procurou responder a uma interrogação que lhe foi surgindo ao longo das três semanas de debates e reflexões: "Que poderá significar para a Igreja encerar este Sínodo da Família?".
     As respostas são diversas, como podemos ver de seguida:

     " (...) Significa que solicitámos a todos que compreendam a importância da instituição da família e do Matrimónio entre homem e mulher, fundado sobre a unidade e a indissolubilidade e a apreciá-la como base fundamental da sociedade e da vida humana.

     Significa que escutámos e fizemos escutar as vozes das famílias e dos pastores da Igreja que vieram a Roma carregando sobre os ombros os fardos e as esperanças, as riquezas e os desafios das famílias do mundo inteiro.

     Significa que demos provas da vitalidade da Igreja Católica, que não tem medo de abalar as consciências anestesiadas ou sujar as mãos discutindo, animada e francamente, sobre a família.

     Significa que procurámos olhar e ler a realidade, melhor dito as realidades, de hoje com os olhos de Deus, para acender e iluminar, com a chama da fé, os corações dos homens, num período histórico de desânimo e de crise social, económica, moral e de prevalecente negatividade.

     Significa que testemunhámos a todos que o Evangelho continua a ser, para a Igreja, a fonte viva de novidade eterna, contra aqueles que querem «endoutriná-lo» como pedras mortas para as jogar contra os outros.

     Significa também que pusemos a nu os corações fechados que, frequentemente, se escondem mesmo por detrás dos ensinamentos da Igreja ou das boas intenções para se sentarem na cátedra de Moisés e julgar, às vezes com superioridade e superficialidade, os casos difíceis e as famílias feridas.

     Significa que afirmámos que a Igreja é Igreja dos pobres em espírito e dos pecadores à procura do perdão e não apenas dos justos e dos santos, ou melhor dos justos e dos santos quando se sentem pobres e pecadores.

     Significa que procurámos abrir os horizontes para superar toda a hermenêutica de conspiração ou perspectiva fechada, para defender e difundir a liberdade dos filhos de Deus, para transmitir a beleza da Novidade cristã, por vezes coberta pela ferrugem duma linguagem arcaica ou simplesmente incompreensível.


     No caminho deste Sínodo, as diferentes opiniões que se expressaram livremente – e às vezes, infelizmente, com métodos não inteiramente benévolos – enriqueceram e animaram certamente o diálogo, proporcionando a imagem viva duma Igreja que não usa «formulários peparados por antecipação», mas que, da fonte inexaurível da sua fé, tira água viva para saciar os corações ressequidos.[1]

     E vimos também – sem entrar nas questões dogmáticas, bem definidas pelo Magistério da Igreja – que aquilo que parece normal para um bispo de um continente, pode resultar estranho, quase um escândalo – quase! –, para o bispo doutro continente; aquilo que se considera violação de um direito numa sociedade, pode ser preceito óbvio e intocável noutra; aquilo que para alguns é liberdade de consciência, para outros pode ser só confusão. Na realidade, as culturas são muito diferentes entre si e cada princípio geral – como disse, as questões dogmáticas bem definidas pelo Magistério da Igreja – cada princípio geral, se quiser ser observado e aplicado, precisa de ser inculturado.[2] 
     (...)
     A experiência do Sínodo fez-nos compreender melhor também que os verdadeiros defensores da doutrina não são os que defendem a letra, mas o espírito; não as ideias, mas o homem; não as fórmulas, mas a gratuidade do amor de Deus e do seu perdão. Isto não significa de forma alguma diminuir a importância das fórmulas – são necessárias –, a importância das leis e dos mandamentos divinos, mas exaltar a grandeza do verdadeiro Deus, que não nos trata segundo os nossos méritos nem segundo as nossas obras, mas unicamente segundo a generosidade sem limites da sua Misericórdia (cf. Rm 3, 21-30; Sal 129/130; Lc 11, 47-54). Significa vencer as tentações constantes do irmão mais velho (cf. Lc 15, 25-32) e dos trabalhadores invejosos (cf. Mt 20, 1-16). Antes, significa valorizar ainda mais as leis e os mandamentos, criados para o homem e não vice-versa (cf. Mc 2, 27).

     Neste sentido, o necessário arrependimento, as obras e os esforços humanos ganham um sentido mais profundo, não como preço da Salvação – que não se pode adquirir – realizada por Cristo gratuitamente na Cruz, mas como resposta Àquele que nos amou primeiro e salvou com o preço do seu sangue inocente, quando ainda éramos pecadores (cf. Rm 5, 6).

     O primeiro dever da Igreja não é aplicar condenações ou anátemas, mas proclamar a misericórdia de Deus, chamar à conversão e conduzir todos os homens à salvação do Senhor (cf. Jo 12, 44-50).
     (...)"

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